Gabriela Contreras

 

 

Sometimes I write and, sometimes, you read it.

Those are personal texts that I wrote in Portuguese, just for fun. The translation is on its way :)

 
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É impossível passar pela Av. Brigadeiro Luis Antônio, em São Paulo, sem ouvir seus gritos. Mas, por que toda essa bravura?

 

A LOUCA DA BRIGADEIRO.

 

Uma vez, disse o poeta: “como é bom morrer de amor e continuar vivendo”. Disse isso, acho eu, porque não pensou em quem viveu quase uma vida morrendo por quem já se foi. Ela vivia assim.

 

Na sombra de um passado, esbravejando contra o tempo, contra Deus e contra ele. Justo ele, que só a abandonava poucas horas no dia. Horas, em que ela tinha paz. Quem passava, pensava “por que essa louca grita tanto?”, sem saber que a verdadeira pergunta começava com “com quem?”.

 

Alguns tentavam desvendar o mistério. Depois dos sustos e dos gritos, paravam de prestar atenção nos celulares e tentavam, em meio a passos atrasados, entender aquele diálogo dela com... ela mesma?

Mal sabiam que em meio aos xingamentos pro além e às conversas sobre um tal crime, ela escondia um amor. Aquele, que foi embora sem dizer até logo, mesmo tendo prometido ficar.

 

Ela gritava pra ver se ele, onde quer que estivesse, ouvia. Se respondia. Ou, se assumia a culpa de a ter deixado sozinha ali.

Ela xingava pra ver se ele decidia ir embora. Se levava o passado com ele. Se deixava ela sossegar.

Tudo isso. Em verbos descasados, conversas malucas e garganta arranhada.

Tudo isso. Em meio a uma vida inteira jogada na rua, esperando ele reviver ou morrer de vez.

Tudo isso. Em meio a passantes e olhares de julgamento que não sabiam da missa a metade: ela um dia tinha vivido na poesia, com casa térrea e cobertor, a alegria de morrer de amor, mas acabará enlouquecendo, justamente, pela falta daquele que a fez padecer.

 

 
 
 
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Um dia fotografei uma cena e inventei minha própria realidade: um conto gostoso de ler.

 

TODO MUNDO SABE OLHAR PARA O CÉU.

Todo mundo sabe olhar para o céu, mas a maioria de nós não sabe admirá-lo. E foi com seu pai que o pequeno Bruno aprendeu. Desde pequenininho, recém-saído da barriga, ele ficava horas ouvindo histórias relacionadas às nuvens, aviões, astronautas e, é claro, à lua. Nem sabia o que as palavras queriam dizer, mas sentia que quanto mais apertasse sua mãozinha no dedo daquele falador, a falação não pararia até ele dormir. E isso lhe fazia um bem danado.


Quanto ao pai, de família humilde, não podia nem ler a palavra avião. Não porque não soubesse, e sim porque a vida lhe fez parar de enxergar. Apesar disso, sua paixão pelas coisas do céu e do ar fez com que ele decorasse a ordem dos planetas, 54 espécies de passarinhos, todos os modelos de avião e cantasse mais de 100 músicas sobre a lua. 


Quem o conhecia falava que quando seu filho nasceu a conversa era sempre a mesma: “meu menino vai voar alto e vai se chamar Neil”. Para quem sabia da história, a referência ao primeiro homem a pisar na lua era clara, mas não haviam argumentos que fizessem a mãe da criança aceitar um nome americano no seu filho, que era baiano.

 

Dito e feito. Com mulher não tem conversa, e o nome ficou o do bisavô.  Mas, mesmo achando um pouco de loucura todos aqueles causos sobre o ar, nem ela, ou qualquer outra pessoa, pôde frear a admiração de Bruno pelas histórias de seu pai. Nem mesmo a vida, quando, finalmente, realizou o seu maior desejo e o levou para o céu.


Foi então que o mundo pareceu desabar. Sozinha, com um menino de colo e recém-chegada à capital, muitas vezes a esperança a abandonou. Ao olhar para o seu filho, lembrava do marido e de como um homem, que não podia ver a um palmo do seu nariz, levantava o seu ânimo apenas com histórias e loucuras jamais vividas. Se preocupava muito nos dias em que não tinham o que comer, mas nem tanto pela comida, porque essa algum vizinho arranjava. E, sim pelo fato de que, talvez, nunca tivesse dinheiro o suficiente nem para levar o pequeno Bruno para ver de perto um avião, quanto mais para transformar aqueles sonhos em realidade. 


Eram nestes dias também, que além da preocupação, o que lhe enchia a cabeça, e os olhos, era ver que só ela estava prestando atenção nas peças que a vida pregava. O projeto de aviador que ela tinha em casa não estava nem aí para as coisas terrenas. Uma vez ele tinha aprendido a admirar o céu e era isso o que ele sempre fazia.


Tanto, que de olhar ela entendeu. O dinheiro ajudaria, mas não foi ele quem levou seu marido a ir tão longe. Na falta de posses, ela teria que aprender a investir na maior herança que ele a deixou: a imaginação. Hoje, quando a coisa aperta e parece carregar, sozinha, o mundo todo nos ombros, a mãe para, tira o mundo dali e coloca seu filho no lugar. Se foi a paixão pelo que está nas alturas que o fez ser aquele pequeno sonhador, ela faria de tudo para o levar o mais alto que conseguisse. Todos os dias.

 
 
 
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Nesta foto, no Cemitério da Consolação, um detalhe triste me tocou. Encontrou?

 

INSPIRADO NO DETALHE.

Foi um mero detalhe.
Um segundo qualquer.
Um instante, um momento.

Foi um não. Foi um sim.
Vai saber o que foi. Como foi. Por que foi.
Vai saber por quem é.

Mas foi rápido.
Mal pensado. Bem dito.
Vai saber. Não se sabe.
Só se sabe que acabou. Dá para ver, para sentir.

Foi um mero detalhe.
Foi-se o tempo. Já passou.
Aliás, não passou. E nem vai.
Porque de tão pequeno, rápido e sem importância, ficou. Para sempre.

 
 
 
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Pra quem Cartola escreveu "O mundo é um moinho"? Dizem que foi pra sua enteada, que estava saindo de casa pra seguir o rumo da prostituição. Verdade? Não sei, mas imaginei como foram os minutos anteriores em que ele resolveu escrever a poesia que todos conhecemos.

 

UM DIA EU, NOUTRO ELA.

A noite era comum. A situação, atípica. Todo dia ela chegava em casa às 19 horas e, com um gesto de respeito, pedia sua benção. Mas não naquele dia. Apesar da ausência ele permaneceu sentado na mesma varanda, com o mesmo rádio. Pensava em onde tinha errado e em como nunca poderia substituir o pai daquela menina. Por mais que tivesse tentado com afinco e coração, pai não se substitui. Nunca.

 

Pensava naquelas palavras que, apesar de gritadas na rua por um malandro qualquer, foram ouvidas pelos únicos ouvidos que se importavam, o seu e o de sua mulher, e em como entraram tirando o fôlego que já quase não tinha, devido ao problema no nariz.

Era quase meia noite e nada dela. O homem que já havia vivido de tudo pensava na partida de quem ainda não havia vivido nada. Era cedo, o começo de uma vida que, pela falta de rumo, escolheu o pior: a prostituição. E este ele conhecia na pele.

 

Malandro de nascença, tantas vezes o destino final da boemia foram os bordeis onde, apesar de procurar diversão, encontrava a cada esquina meninas que pareciam cavar o próprio abismo com seus pés. Se lembrou do cinismo da vida e depois lamentou um destino que não era seu, mas de alguém que amava demais. Pensou em seus erros do passado e também naqueles que ainda cometeria atrás de algo melhor. Lembrou que era errado julgar e sentiu por cada sonho seu, triturado pelo mais cruel dos moinhos: a vida.

 

Chorou uma lágrima pequena e ao enxuga-la entendeu que, na verdade, tanto ele fez o papel de pai que até a ensinou a errar, assim como ele sempre errou. “O mundo é um moinho. E, além de triturar, ele gira. Um dia eu, noutro ela. ” E foi assim que cansou de esperar. Já era tarde e sabia que não cabia mais um sermão. Apesar do cansaço resolveu colocar tudo aquilo num papel, porque conselho de pai é assim, precisa ser repetido para ficar na cabeça e se, mesmo assim, ela não o quisesse escutar, pelo menos os outros o escutariam. E foi o que fez.